Na noite desta quarta-feira (22/10) a Câmara Municipal realizou uma Audiência Pública sobre os 20 anos de educação inclusiva em Bauru, desdobrando a data em um debate sobre como enfrentar os desafios da falta de profissionais, recursos materiais e espaços nas escolas, além da demanda que supera o suporte oferecido. A iniciativa foi da vereadora Estela Almagro (PT).
Foi convocado e compareceu o Secretário Municipal da Educação, Nilson Ghirardello. Também estiveram presentes o vereador Júlio César (PP) e representantes do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Bauru (SINSERM), do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (APEOESP), da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de Bauru (APAE) e do Centro Especializado em Reabilitação SORRI-Bauru, além de outras entidades e grupos relacionados ao tema.
Em sua fala inicial, a vereadora Estela Almagro reforçou que a proposta da Audiência Pública era ser uma oportunidade de escuta. Além disso, fez um panorama da realidade que a fez chamar o debate, que chega a seu conhecimento inclusive com pais e professores procurando-a em seu gabinete com preocupações e desafios. Ela afirmou que é preciso colocar o assunto na mesa de discussões, falando, por exemplo, do redimensionamento da rede pública, da capacidade orçamentária do município para essa demanda e de perspectivas de aumentar o atendimento seguro a esse público.
Para justificar a urgência do debate, a vereadora ainda citou legislações recentes que devem causar impacto na área. É o caso do Decreto Federal nº 12.686, de 20 de outubro de 2025, que Institui a Política Nacional de Educação Especial Inclusiva e a Rede Nacional de Educação Especial Inclusiva; e a Resolução da Secretaria Estadual de Educação n° 129, de 30 de setembro de 2025, que dispõe sobre a regulamentação da Política de Educação Especial do Estado de São Paulo e do Plano Integrado para Pessoas com Transtorno do Espectro do Autismo – TEA.
Educação inclusiva na Secretaria da Educação
Na sequência, a Secretaria Municipal de Educação teve um momento para apresentar o trabalho da pasta. Após fazer um histórico sobre o marco dos 20 anos da educação inclusiva em Bauru - que começou com apenas 319 estudantes com necessidades especiais mapeados e 6 polos de atendimento - o secretário Nilson Ghirardello passou para os números atuais.
Segundo ele, hoje são 215 professores e 186 agentes educacionais na Divisão de Educação Especial. Além disso, estão em processo de contratação mais 21 professores e 38 cuidadores. No total, a Secretaria atende 1109 estudantes com algum tipo de deficiência, sendo a mais significante numericamente o Transtorno do Espectro Autista (TEA), com 820 estudantes: “número que tem crescido muito”, acrescentou o secretário.
Mais 2410 crianças são atendidas por meio das parcerias que a Prefeitura tem com as seguintes Organizações da Sociedade Civil: APAE, AFAPAB, APIECE, Lar Santa Luzia para Cegos e SORRI.
Ghirardello ainda explicou como funciona o Atendimento Educacional Especializado (AEE), promovido pelos professores da divisão. O AEE identifica, elabora e organiza recursos pedagógicos e de acessibilidade que eliminem barreiras para a plena participação dos estudantes considerando suas necessidades específicas. Ele é feito em salas de recursos multifuncionais ou em itinerância, dentro de sala de aula comum.
Na sequência, a pasta ainda abordou como funciona a formação e capacitação continuada dos profissionais que atuam na área e a dificuldade de atrair pessoas para esses cursos.
Participação do público
Nesse ponto, a palavra foi aberta para os presentes se manifestarem e, como disse a vereadora Estela Almagro, “contrapor a teoria com a prática”.
O primeiro questionamento foi justamente em relação à formação dos profissionais, tanto cobrando maior divulgação dos cursos (a Secretaria respondeu que é feita por site, diretamente com as escolas e em canais como redes sociais e grupos de WhatsApp) quanto a ampliação dos treinamentos para todos os funcionários da educação, uma vez que as crianças convivem com todos que estão na estrutura escolar.
Isso também reverberou tanto em sugestões sobre a aplicação e aferição das formações na prática, pensando nos resultados, e sobre a importância de ter protocolos para gerenciamento de crise, quanto em demandas por mudanças organizacionais na Prefeitura, que não reconhece este tipo de curso para avanço na carreira de servidores fora da área específica da educação especial, entre outros pontos a serem melhorados.
Também foram compartilhados outros relatos de mães de crianças atípicas e profissionais atuantes na área. Apesar de haverem elogios ao trabalho da Secretaria, diversos presentes afirmaram ainda faltar um olhar atencioso para esse público, por exemplo ouvindo as famílias na hora da Prefeitura fazer planos e avaliando se tudo que está no papel está sendo realizado. As críticas giraram em torno do que é visto na realidade diária.
Nesse sentido, o vereador Julio Cesar pontuou que recebe depoimentos difíceis de munícipes sobre o tema e afirmou que “o sistema está se mostrando falho, precisa ser mudado”. Vendo a gravidade do que foi relatado, ele afirmou ser importante ter respostas e levar o debate para fora da bolha da “causa da inclusão”.
Questões estruturais ainda tiveram vez. É o caso do município estar sobrecarregado uma vez que a responsabilidade da educação inclusiva recai mais à educação municipal do que à estadual; de problemas de infraestrutura nas escolas, como falta de internet e outros equipamentos básicos; do manifesto de “profunda preocupação” da presidente da APAE, Maria Amélia Ferro, ao Decreto Federal nº 12.686 (citado no início da Audiência), que pode restringir a continuidade dos serviços de entidades, às quais chamou de “não excludentes, mas complementares”; de críticas profundas, da APEOESP, ao governador Tarcísio Freitas por sua postura em relação à educação; entre outros.
Encaminhamentos
Para finalizar, a vereadora Estela Almagro sintetizou as falas da noite e reforçou o quão grave é o retrocesso na perspectiva inclusiva e a fragilização do atendimento escolar e da formação pedagógica continuada dos profissionais atuais.
Levando em conta tudo o que foi levantado na Audiência Pública, ela propôs a realização de reuniões técnicas e multissetoriais que envolvam atores importantes da causa e a própria Comissão de Educação da Câmara Municipal: “muitos têm o que contribuir”, lembrou. As reuniões devem ser viabilizadas já nas próximas semanas.
“Precisamos que esse debate se transforme em prática, é um chamado para a discussão do desafio da demanda que supera o suporte e, então, para o debate se há a necessidade de redimensionamento da rede e de regulamentação”, finalizou.